domingo, 23 de janeiro de 2011

As raízes do amor

Seremos realmente livres na escolha de quem amamos? Alguns terapeutas garantem que não. Os papéis aprendidos na infância condicionam as relações amorosas na idade adulta.



Por Clara Soares

Rosália e Alfredo conheceram-se, apaixonaram-se, casaram, mas não viveram felizes para sempre. Após uma separação de alguns meses, Rosália admitiu que tinha com o marido reacções muito semelhantes às que tivera com namorados anteriores e chegou a ponderar a hipótese de refazer a sua vida sozinha. Alfredo procurou entretanto outras companheiras, mas constatou na prática que eram muito parecidas com a que elegeu para mulher, anos antes. Cansados e impotentes, dispuseram-se, pela primeira vez, a avaliar o que poderiam fazer de diferente para alterar o curso dos eventos que levaram à crise conjugal. Rosália decidiu-se a telefonar ao marido a propor-lhe uma nova oportunidade. “O que fiz de bom por mim sem tu estares ao meu lado? Quais são os meus pontos fracos? As minhas necessidades? O que posso dar-te sem cobrar?” As questões foram postas na mesa e o saldo tem sido positivo.


O que faz com que gostemos de uma pessoa e não de outra, que, aparentemente, nos poderia trazer menos dissabores? Até que ponto escolhemos as pessoas por quem nos apaixonamos? Esta pergunta foi feita pela terapeuta americana Anne Teachworth, fundadora e directora do Instituto Gestalt, no Estado de Nova Orleães. Com base na sua experiência clínica, a especialista em aconselhamento conjugal desenvolveu o modelo psicogenético, que pretende dar a conhecer os padrões de relacionamento inconscientes que todos temos na hora de eleger alguém para partilhar a nossa intimidade.No seu livro, intitulado "Porque escolhemos os parceiros que temos" (Why we pick the mates we do), a autora lança o desafio: “Podemos decidir o que queremos de um parceiro, mas existe uma parte de nós pré-programada e desconhecida e que é responsável pelas pessoas que atraímos, sem nos darmos conta.”Nestes casos, que Anne considera a maioria, os amantes podem funcionar como as peças perfeitas de um todo, apesar de estarem longe de formar o par ideal. De acordo com este modelo, aproximamo-nos de quem tem as mesmas questões que nós, os mesmos problemas não resolvidos e com uma herança familiar – ou história – semelhante (incapacidade para se entregar emocionalmente, medo de perder ou de ser rejeitado por quem se gosta, infidelidade, dependência, abuso ou abandono). Isso explica os frequentes desabafos – “O que é que eu vi naquela pessoa, que me faz a vida num inferno?” ou “Afinal tenho vivido ao lado de uma pessoa que desconheço”. Esse estranho parece ser a parte escondida de nós, a mesma que atraímos sem ter consciência, que se revela nos momentos de conflito.


O modelo explica ainda por que o amor é cego e, não raras vezes, fruto de “uma paixão à primeira vista”. Enamorados, os parceiros tendem a não olhar para “os pontos de fuga” e a concentrar a sua atenção nas fantasias de um futuro radioso, em que o outro vai preencher neles sentimentos reprimidos e carências de vária ordem, que já vêm do passado. No quotidiano conjugal, os tais programas inconscientes acabam por tomar o controlo e cada um reage ao outro como se ele fosse alguém com quem se viveu uma situação complicada. As expectativas depositadas naquela união acabam por ser defraudadas e o dilema só termina quando a pessoa percebe que está a viver o seu próprio filme através do parceiro.


Como sair desta encruzilhada? A razão por que muitas ligações amorosas colapsam prende-se com o facto de assentarem na paixão, fruto da química hormonal. Reconhece-se agora que a biologia do amor não dura mais do que dois anos, na melhor das hipóteses. Depois disso, poucos são os que conseguem passar o teste da realidade e recriar a relação noutros moldes e com outros pólos de interesse. Mesmo se a alternativa a um amor fracassado for outro romance com um parceiro exactamente oposto ao anterior, o problema tende a manter-se, uma vez que o padrão de relacionamento familiar permanece registado no cérebro emocional.


www.maxima.pt (in MSN)

Sem comentários:

Enviar um comentário

Comentar